A
ALTERNÂNCIA DO PODER E O PROBLEMA DO “PURISMO” NO MARANHÃO
Jhonatan Almada, historiador, integra o quadro técnico da Universidade Federal do Maranhão
Enquanto não compreendermos
que uma das problemáticas que nos cinge e nos emperra é a dominância de um
mesmo grupo político por décadas seguidas, se reproduzindo à custa da exclusão
permanente de milhões de maranhenses, dificilmente poderemos mudar.
De fato, se a população não
compreender que o projeto liderado por esse grupo jamais responderá às questões
do nosso tempo, por que implicaria em revelar o vazio dele mesmo, apenas
simulacros de projetos pessoais de poder, a mudança demorará. Nada mais
contraditório do que dizer que esse projeto é pautado no planejamento, posto
que a inexistência ou a efemeridade de planejamento mais lhes caracterize. O
que há é tão somente o ir fazendo e fazendo o que traz benefícios imediatos e
mediatos, tanto político-eleitorais, quanto garantidores da própria reprodução.
A unidade das oposições é o
ponto nevrálgico. Existem duas posições no cenário político do Maranhão: se
opor ao atual governo do grupo dominante e sua perspectiva de continuar no
poder ou submeter-se, aliar-se e apoiar esse grupo. O se opor abrange um
complexo. Envolve forças de esquerda, de direita, de centro e muitos ex-integrantes
do grupo dominante. E como se percebe o “se opor” não possui uma organicidade
ou unicidade.
A chave é a especificidade
política local: a oligarquia como grupo dominante politicamente hegemônico a
ser vencido. Ainda que dentro dessa oligarquia tenhamos facções, a diretiva do
oligarca impõe uma unidade de ação cuja força não se pode desprezar ou
subavaliar.
A ausência de generosidade
das lideranças e a incapacidade de perceber a oportunidade histórica vindoura
são duas limitações à unidade das oposições. Por um lado, há o “purismo”, vamos
chamar assim. As categorias analíticas descontextualizadas ou desatualizadas
(luta de classes, socialismo, comunismo, etc) impedem a firmatura de um
compromisso básico de unidade política entre as forças desse complexo. Por
outro lado, existem também projetos pessoais de poder nesse conjunto, incapazes
de ceder frente a um projeto maior, generoso e diversificado.
Isso não é um nó-cego, a
unidade das oposições ou a formação de frentes amplas não é uma novidade em
política, nem na América Latina, nem na Europa. O ponto é como conferir unidade
em áreas estratégicas (educação, saúde e segurança) na diversidade de
interesses e compromissos políticos firmados, garantindo a implementação
majoritária do projeto vencedor. O contrário, a cegueira, está em esquecer as
especificidades e as oportunidades de cada conjuntura política, imobilizando-a
em uma estrutura atualizada, mas imutável.
As mobilizações sociais que
tomaram as ruas em 2013, no Maranhão, trouxeram essa especificidade na pauta de
suas reivindicações: a oligarquia como inimigo número 1. O “comum” das
mobilizações locais tem esse elemento como convergência do descontentamento de
classes e frações de classes, em geral, excluídas ou inconformadas com a
situação social.
A unidade política demanda liderança
e projeto. A liderança é uma pessoalidade. Ao longo da história do Maranhão ela
já foi o próprio José Sarney, Neiva Moreira, Jackson Lago, dentre outros – nem
preciso dizer da diferença abissal entre os dois últimos e o primeiro. Os
adeptos do “purismo” querem um projeto sem liderança. Temem o nascimento de uma
nova oligarquia. Projeto sem liderança constrói o debate político, levanta
bandeiras dos movimentos sociais, critica a oligarquia e as práticas
oligárquicas, entretanto, não alcança e não convence a maioria que vota.
Construir esse projeto comum
e aceitar uma liderança que o corporifique é e sempre será um risco e uma
possibilidade. O risco da liderança não cumprir com plenitude os eixos centrais
do projeto comum e a possibilidade de ser cumprido. Em relação ao risco o
caminho é romper e recomeçar. Quanto à possibilidade o caminho é apoiá-la de
forma efetiva, intensiva e consistente.
Entendo ser fundante, nesse
“comum”, a introdução de novos sujeitos políticos na arena de disputas pelo
fundo público.
O filme “Uma história de amor
e fúria”, dirigido por Luiz Bolognesi e lançado no segundo semestre de 2013
apresenta a história do Brasil, passado e futuro, a partir da relação de um
homem imortal e uma mulher que se reencontram ao longo dessa história. Um dos
cenários é o Maranhão. O contexto é a Balaiada de 1838. O personagem é
fabricante de balaio e oprimido pela classe dominante do Império. Ele e sua
família sofrem nas mãos de um coronel da Guarda Nacional. A opressão o faz uma
das lideranças da Balaiada. O amor o coloca na luta pela libertação dos
oprimidos.
Essa dualidade contraditória
retratada pelo filme, amor e fúria, nos deve alimentar para a construção do
diferente. Amor como incômodo quanto à realidade de imobilismo político e
corrupção generalizada e fúria para somar forças em prol da transformação dessa
realidade.
Ignacio Rangel em um de seus
escritos chamaria isso de dualidade entre o antigo e o novo. Aquilo que tem
sido a prática política histórica de nossa formação social e o que diverge
diametralmente dessa prática. O antigo é a democracia restritiva do Império e
das primeiras décadas da República, vivíssima na forma oligárquica de governar.
A participação popular e a mudança regular dos governantes, características da
democracia brasileira contemporânea lhe são avessas. O novo que não consegue
nascer e se afirmar. Penso que apesar dos avanços, ainda é difícil contestar
que o Maranhão não viva “na democracia de mentira”, conforme denúncia de
Marcellino Machado do início do século XX.
O Balanço de Gestão Política,
teorizado por Carlos Matus, é o primeiro elemento a ser considerado para uma
mudança no Maranhão. Esse balanço sintetiza os resultados positivos e negativos
em relação às demandas políticas dos atores sociais e da população em geral. A
democracia está essencialmente vinculada à distribuição do poder político,
fortalecê-la passa pela criação de novas instâncias consultivas, deliberativas
e decisórias, isto é, instâncias que materializem a descentralização e a desconcentração
do poder.
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