Pular para o conteúdo principal

Jackson Lago - uma biografia para o nosso tempo


JACKSON LAGO

uma biografia para o nosso tempo[1]

O Grupo Escolar Oscar Galvão e o Colégio Professor Vidigal ainda estão lá, em Pedreiras, como testemunhas vivas a guardar memórias desse maranhense exemplar aí nascido em 01/11/1934.

Estruturava-se, então, uma rara vocação de serviço e servidor público, sua marca indelével por toda a vida.

De Pedreiras a São Luís, onde freqüentou o prestigiado Colégio Maristas, Jackson Lago foi amadurecendo, mesmo que adolescente, sua aprendizagem de mundo e seu convívio humano e cultural com a admirada Atenas Brasileira.

Vocacionado a servir e a salvar vidas, formou-se médico cirurgião na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, aprimorando-se também na residência médica do Departamento de Doenças Pulmonares da Policlínica Geral da Cidade do Rio, então Capital político-administrativa e cultural do Brasil.

Com a alma encharcada de chão das vivências da saga do arroz e das aventuras sociais e humanas dos migrantes nordestinos nos vales úmidos do Mearim e Pindaré maranhenses; além do dia-a-dia dos estudos médicos e do trabalho no antigo IAPC, Jackson Lago viu, de perto, no Rio, os fervilhantes e decisivos acontecimentos políticos do Brasil dos anos 1950 e 1960: o suicídio do Presidente Getúlio Vargas, a transferência por JK, da capital federal do Rio para Brasília, a renúncia do Presidente Jânio Quadros, a deposição do Presidente João Goulart.

Na condição de estudante de medicina, participa, então, das batalhas da UNE (União Nacional dos Estudantes), presencia o Comício de 13 de março de 1964 da Central do Brasil pelas Reformas de Base, fez-se amigo de Neiva Moreira e João do Vale.

Com o vazio político decorrente do Golpe Militar de 1964 e concluído seu curso e a especialização médica, retorna ao Maranhão para a batalha da medicina, sem imaginar que sua personalidade política e profissional já consolidada seria de pronto notada e requisitada para a construção da História.

Solicitada pelo Prefeito Epitácio Cafeteira, a Associação Médica do Maranhão indicou Jackson Lago para ser o novo Secretário Municipal de Saúde de São Luís, o que permitiu também que participasse ativamente do primeiro grande confronto político com o sarneysismo que tentou agressivamente depor o prefeito recém eleito (Cafeteira), revelando e antecipando seus métodos ditatoriais e anti-democráticos agora conhecidos do Brasil inteiro.

Paralelamente ao início desses embates, assumiu a cadeira de professor de cirurgia torácica da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), clinicou no Sanatório Getúlio Vargas, no Hospital Geral do Estado e no Hospital Presidente Dutra.

Anos pacientemente seguidos e vividos de acompanhamento diário das mazelas sociais corporificadas na situação sanitária de pessoas, famílias e comunidades, acabaram por irromper na consciência e nas decisões do médico humanista, que se viu, então, arrebatado para as fileiras da resistência democrática.

Em 1974, é eleito deputado estadual pelo MDB (Movimento Democrático Brasileiro) maranhense, exercendo aí um extraordinário mandato parlamentar em favor da luta pela terra e contra a grilagem; denuncia a nefasta Lei de Terras do Sr. Sarney; funda O Rumo, um jornal de combate em favor da vida; convida, via Assembléia Legislativa, Dom Helder Câmara a visitar e pregar em São Luís; alia-se aos movimentos pela moradia, engajando-se na batalha dos direitos humanos; participa da campanha de educação popular pela saúde e é voz atuante na defesa dos direitos democráticos pela anistia, pelo retorno dos exilados e das eleições diretas.

Convidado por Leonel Brizola, participou, em 1979, do Encontro de Lisboa (Portugal) reunindo trabalhistas do Brasil e exilados, preparando as bases teóricas, políticas e culturais de reconstituição do lendário Partido Trabalhista Brasileiro, ao lado de Neiva Moreira, Darcy Ribeiro, Francisco Julião, Teotônio dos Santos, Abdias Nascimento e tantos outros.

Conquistada a Anistia, é um dos fundadores nacionais do Partido Democrático Trabalhista (PDT), após ver esbulhado de Leonel Brizola o sonhado PTB de Getúlio Vargas e João Goulart.

Visando fortalecer o novo partido, candidata-se em 1985 a prefeito de São Luís.

Em 1987, Epitácio Cafeteira, agora eleito e empossado governador, repete a dobradinha de 20 anos atrás e nomeia Jackson Lago Secretário Estadual de Saúde, oportunidade plenamente aproveitada para a realização de um trabalho de impacto do qual sobressai a implantação de 5 (cinco) Unidas Mistas de Saúde da Ilha de São Luís, nos bairros do Anjo da Guarda, Coroadinho, Bequimão, Cidade Operária e Maiobão, funcionando 24 horas por dia.

Em 1988, já reconhecido, fortalecido e experimentado pelas batalhas da vida cotidiana e das lutas democráticas pela cidadania, São Luís o consagra seu dirigente máximo, elegendo-o prefeito da Capital. Consolidava-se aí uma fortíssima liderança democrática capaz de mudar São Luís para sempre.

Em 1992, a população, aprovando seu trabalho, elege prefeita sua sucessora indicada.

Sentindo sua falta, a chapa Volta Jackson (com Domingos Dutra, do PT, na vice) é eleita em 1996 para governar São Luís outra vez.

Em 2000, já instituído o dispositivo legal da reeleição, Jackson é reeleito e, pela terceira vez, assume, em 2001, a Prefeitura de São Luís.

Em 2002, candidata-se outra vez (a primeira foi em 1994) a governador do Maranhão e recebe consagradora votação no 1º turno, avenida aberta para uma vitória retumbante no 2º turno, disputa impedida por artifícios absurdos arrancados junto à inexplicável Justiça Eleitoral do Estado e do País.

Foram tempos duros, maldosos e mesquinhos, recheados de golpes e rareados de esperança. Mas o batalhador Jackson Lago não desistiu.

Reconhecido no slogan Trabalho e Honestidade, admirado pelo senso agudo de respeito e pontualidade, sério, cordato, mas aguerrido e corajoso, experiente nas artes administrativas de fazer mais com menos, eleito duas vezes em pesquisa nacional do Instituto Data Folha melhor prefeito de capitais do Brasil; vê, em 2004, ser reeleito Prefeito de São Luís seu vice-prefeito de 2000 e sucessor por ele indicado.

Todo esse ativo cultural e político, de certa forma incomum no Estado sitiado, é admiravelmente bem utilizado para a constituição da Frente de Libertação do Maranhão, que Jackson Lago funda para a eleição de Governador de 2006, pleito histórico de repercussão nacional e internacional e divisor de águas na historiografia maranhense.

No 2º turno é eleito e consagrado o novo Governador do Maranhão.

Até ser golpeado e destituído do governo maranhense em abril de 2009, Jackson Lago deixa um legado extraordinário de obras, realizações e diretrizes econômicas, sociais, culturais e políticas que, sem sombra de dúvida, iluminarão a conquista do Maranhão para a democracia, o desenvolvimento e a prosperidade.

Como profissional médico, Jackson Lago:

- salvou vidas e mais vidas;

- dedicou-se exclusivamente ao serviço público de saúde, sempre na perspectiva do social e do popular;

- foi um reconhecido e competente médico formador de médicos.

Como prefeito (três vezes eleito) de São Luís, Jackson:

- deu um salto quantitativo e qualitativo formidável da educação;

- estruturou, ampliou e democratizou os serviços públicos de saúde, com diversas unidades descentralizadas e dois Socorrões de suporte para a Ilha e o Estado inteiro;

- fez obras de saneamento, de drenagem superficial e profunda, contribuindo para a redução da mortalidade infantil em significativos 54%;

- implantou asfalto por São Luís inteira, não distinguindo o centro dos bairros, e os bairros da zona rural;

- a coleta de lixo foi consideravelmente ampliada e o Aterro Sanitário da Ribeira implantado;

- inovou com o Orçamento Participativo, o Conversando com a Cidade, a Bolsa Família Municipal de um salário mínimo, as Feiras Livres, o Consórcio Intermunicipal de Agricultura, a Casa Familiar Rural, as Brigadas de Vacinação, os Encontros das Cidades, o Hospital da Criança, a Transrural, o serviço de Salva Vidas nas Praias, a Guarda Municipal;

- participou da conquista São Luís – Patrimônio Cultural da Humanidade;

- recebeu em São Luís, em 1990, a visita histórica do Papa João Paulo II;

- construiu o Residencial da Jansen, na Ilhinha – São Francisco, eliminando palafitas insalubres da Lagoa da Jansen, colocando famílias pobres em residências dignas em área nobre da Capital;

- construiu o belíssimo Museu e Praça de Eventos Maria Aragão, único projeto urbanístico de Oscar Niemeyer no Nordeste brasileiro;

- definiu as bases do Festival Internacional da Música;

- implantou o Circo Escola;

- implantou o Circo da Cidade, hoje, Circo Nelson Brito;

- recebeu prêmios e mais prêmios de reconhecimento nacional, a exemplo do prêmio Prefeito Amigo da Criança;

- enfim, como gostava de dizer, recuperou a alta estima da cidade e a confiança da população no serviço e no servidor público, na boa política e na administração pública decente.

Como Governador, mesmo com o governo sistematicamente sabotado e brutalmente interrompido, Jackson Lago:

- implantou o primeiro Socorrão fora de São Luís, em Presidente Dutra, iniciando a meta do seu governo, que era implantar cinco Socorrões no interior do Estado ao final de 4 (quatro) anos;

- construiu 173 escolas, dignas e grandes, para a rede estadual de ensino, parte das 300 escolas que estava determinado a construir;

- concluiu a Ponte da Liberdade, em Imperatriz, obra de imensa relevância para o desenvolvimento regional;

- iniciou a construção do Projeto Rio Anil/Liberdade, destinado a ser o maior projeto urbanístico do Estado;

- disponibilizou recursos para construir, em São Luís, dois viadutos (Calhau e Forquilha), a conclusão da Avenida Litorânea e centenas de quilômetros de asfalto na Ilha;

- implantou, na Segurança Pública, o conceito e o programa revolucionário Segurança Cidadã;

- realizou os inéditos Fóruns Governo/Sociedade, em quatro macrorregiões do Estado;

- conseguiu aprovar no Parlamento Estadual uma nova regionalização para democratizar de vez o planejamento e a execução do desenvolvimento territorial em 32 regiões do Estado;

- aprovou e destinou recursos para a perenização dos lagos da Baixada Ocidental Maranhense, no projeto apelidado de Águas Fujonas;

- ampliou espaços institucionais para o avanço dos direitos humanos, criando novas secretarias de estado, como a Secretaria da Mulher, dos Direitos Humanos, da Igualdade Racial e da Juventude;

- recriou instituições fundamentais ao planejamento e desenvolvimento do Estado, a exemplo do IMESC – Instituto Maranhense de Estudos Econômicos e Sociais e da AGERP – Agência Estadual de Assistência Técnica, Extensão Rural e Pesquisa Agropecuária;

- reformulou o FUMACOP – Fundo Maranhense de Combate à Pobreza, direcionando-o à promoção da economia dos pobres, rumo a uma verdadeira política de geração de riqueza, geração de renda e prosperidade nas várias regiões do Estado;

- implantou, pela primeira vez, no Planejamento do Estado, o conceito da SUBSIDIARIEDADE, base para a municipalização e o desenvolvimento local sustentável;

- apoiou com entusiasmo o Consórcio Turístico Interestadual ROTA DAS EMOÇÕES, unindo forças com o Piauí e o Ceará em prol do desenvolvimento sustentável das regiões Jericoacoara, Delta do Parnaíba e Lençóis Maranhenses;

- abriu e asfaltou novas pontes e estradas, a exemplo da estrada de Turiaçu;

- criou um novo clima para a atração democrática de novos empreendimentos industriais, agrícolas e comerciais;

- facilitou as principais providências preliminares para a implantação da Refinaria de Bacabeira e do Pólo de Gás de Capinzal do Norte;

- ousou transferir os recursos públicos financeiros do Estado de uma rede bancária privada para o domínio público do Banco do Brasil;

- recebeu no Palácio dos Leões o revolucionário Presidente Venezuelano Hugo Chaves;

- instalou o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, democratizando o debate sobre o desenvolvimento do Estado;

- sem hostilizar os produtores rurais da cadeia do agronegócio, foi extremamente solidário com os movimentos sociais, entre os quais a FETAEMA e o MST.

Ao contrário do que dizem seus desafetos, Jackson Lago não caiu em razão dos defeitos atribuídos ao seu Governo. A História, desde cedo, já está a demonstrar que Jackson foi violentamente golpeado em razão das virtudes e conquistas políticas, econômicas, sociais e culturais do seu Governo se avolumavam. Em ritmo tal que ameaçavam seriamente a sobrevivência política da oligarquia de mais de 40 anos de domínio discricionário do poder no Maranhão.

Por tudo isso, Jackson Lago é uma biografia exemplar para o nosso tempo.


[1] Elaborada por Leo Costa, sociólogo, ex-prefeito de Barreirinhas, militante, fundador e histórico do PDT-MA.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

BANQUE O DURO, MEU CHEFE

BANQUE O DURO , MEU CHEFE ! Por Raimundo Palhano Não deixe o seu lugar. Foi o conselho do venerável Bita do Barão de Guaré ao presidente do Senado, José Sarney, que, ao que parece, está sendo levado extremamente a sério. Quem ousaria desconsiderá-lo? Afinal, não se trata de um simples palpite. Estamos frente à opinião de um sumo sacerdote do Terecô, um mito vivo para o povo de Codó e muitos outros lugares deste imenso Maranhão. Um mago que, além de Ministro de Culto Religioso, foi agraciado pelo próprio Sarney, nos tempos de presidência da República, com o título de Comendador do Brasil, galardão este acessível a um pequenino grupo de brasileiros. Segundo a Época de 18.02.2002, estamos falando do pai de santo mais bem sucedido, respeitado, amado e temido do Maranhão. Com toda certeza o zelador de santo chegou a essa conclusão consultando seus deuses e guias espirituais. Vale recordar que deles já havia recebido a mensagem de que o Senador tem o “corpo fechado”. Ketu,...

A Educação do Brasil

A Educação do Brasil: cinco contrapontos necessários Este livro é fruto de um esforço de sistematização sobre cinco questões relevantes presentes no debate sobre a educação pública do Brasil e que tenho abordado em aulas, conferências e intervenções públicas, sobretudo para estudantes na Universidad Autónoma de Baja California (UABC), Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Centro Universitário IESB, Universidade Estadual de Roraima (UERR), Centro Universitário UNDB, Faculdade Santa Luzia e Universidade Estadual do Maranhão (UEMA). Portanto, há uma postura didática na minha escrita para responder às seguintes perguntas: 1. Existe só descontinuidade nas políticas educacionais brasileiras? 2. A infraestrutura escolar não importa para a qualidade do ensino? 3. Sobra recurso e falta gestão na educação pública? 4. A qualidade do ensino se resume aos resultados das avaliações? 5. As escolas militares são solução para os problemas da educação pública? Organizei as respostas para essas p...