Pular para o conteúdo principal

CENTENÁRIO DE NEIVA MOREIRA

O Instituto Jackson Lago-IJL, a Academia Maranhense de Letras-AML e o Instituto de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão-IEMA estão organizando conjunto de eventos alusivos ao Centenário de Neiva Moreira (1917-2017). A programação elaborada para o mês de outubro inclui o lançamento de livros e a inauguração do Acervo Neiva Moreira na Biblioteca do IEMA Praia Grande, acervo constituído pela biblioteca pessoal de Neiva doada por Beatriz Bissio.

Meu primeiro contato com Neiva Moreira se deu na banca do Bena em Caxias-MA. Ponto em que eu frequentava atrás de revistas e almanaques, interessado em saber da cultura global. Ali tomei contato com a revista Cadernos do Terceiro Mundo e descobri um conjunto de realidades até então invisíveis para mim. Em geral, os países que a Cadernos apresentava eram ignorados pela mídia hegemônica ou quando lembrados destacava-se algo negativo, sempre.

A visão de mundo sobre a África, o Oriente Médio, a Ásia e a América Latina emergiram com uma riqueza de cores aos meus olhos. Histórias seculares e milenares de civilizações diferentes do modelo ocidental. Essa disposição de mostrar a diversidade só existia na revista Cadernos do Terceiro Mundo, nenhuma publicação atualmente se aproxima da linha editorial inaugurada pela Cadernos.

Meu segundo contato com Neiva se deu pelo livro Pilão da Madrugada. Livro com longa entrevista narrando o arco de sua vida, do Maranhão para o Mundo. Tal leitura me fez utilizar na epígrafe de meu livro “A alternância do poder político no Maranhão” a citação que Neiva fez quanto à generosidade de três irmãs que socam o pilão para ajudar viajantes extraviados a encontrarem seu caminho nas madrugadas.

Considerei importante trazer o discurso de Neiva Moreira ao assumir na Câmara dos Deputados, dia 15 de setembro de 1993, 29 anos após seu último mandato de deputado federal:

Sr. Presidente, meus caros colegas, seria muito insincero se dissesse que não me encontro dominado por forte emoção ao retornar a esta Casa, onde durante três mandatos participamos de acontecimentos decisivos da vida pública do nosso País. Serei breve. Em outro momento procurarei fazer uma análise das realidades do nosso País e da nossa visão pessoal e partidária de como encarar esses problemas.

Não sinto a menor amargura. Esses anos de ausência do Parlamento e da Pátria não foram perdidos. Quando o exílio me levou à África, às margens do Rio Congo, sentia que os problemas que ali se verificavam, que faziam padecer o seu povo, eram iguais aos que vivíamos no Rio São Francisco e no Parnaíba.

Eu achava que as novas ideias, as novas realidades, o novo conhecimento que incorporava através do sacrifício e da luta, poderiam permitir melhores, mais profundas e mais tranquilas contribuições no sentido de solucionar nossos problemas. No futuro, seguramente, vamos nos encontrar muitas vezes aqui neste microfone, não apenas concordando, mas também discordando.

Espero, sobretudo, Sr. Presidente, que estejamos unidos pelo desejo de servir ao País para transformá-lo na grande Pátria do futuro, que é o símbolo das nossas esperanças e aspirações. (Muito bem! Palmas.)

O discurso nos dá a dimensão humanista de Neiva Moreira, ao final, sua luta para resolver os problemas do povo era comum a qualquer lugar do mundo. O mais relevante ainda é que Neiva não guardou mágoas e apresentava neste discurso a mesma vontade de contribuir para o Brasil encontrar sua grandeza. Atitude rara em tempos de ódios exacerbados e fascismos armados.

Sugeri formalmente que a Câmara dos Deputados, a Assembleia Legislativa e a Câmara Municipal de São Luís e de Nova Iorque (onde Neiva nasceu) realizem sessões solenes de homenagem pelo Centenário de seu nascimento. É um gesto político de civilidade e reconhecimento ao legado de Neiva.

A última imagem que tive de Neiva Moreira não foi do seu próprio sepultamento, mas sim dele carregando o caixão de Darcy Ribeiro. O tema geracional emerge. Neiva e a estirpe de homens públicos que não se servem do poder se extinguiu ao longo da última década. Poucos podem afirmar que saíram dos mandatos exercidos tão pobres quanto entraram. A paixão com que se colocaram para resgatar a dignidade do povo brasileiro deve estimular nossa geração, ser montanha a qual se aspira subir.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

BANQUE O DURO, MEU CHEFE

BANQUE O DURO , MEU CHEFE ! Por Raimundo Palhano Não deixe o seu lugar. Foi o conselho do venerável Bita do Barão de Guaré ao presidente do Senado, José Sarney, que, ao que parece, está sendo levado extremamente a sério. Quem ousaria desconsiderá-lo? Afinal, não se trata de um simples palpite. Estamos frente à opinião de um sumo sacerdote do Terecô, um mito vivo para o povo de Codó e muitos outros lugares deste imenso Maranhão. Um mago que, além de Ministro de Culto Religioso, foi agraciado pelo próprio Sarney, nos tempos de presidência da República, com o título de Comendador do Brasil, galardão este acessível a um pequenino grupo de brasileiros. Segundo a Época de 18.02.2002, estamos falando do pai de santo mais bem sucedido, respeitado, amado e temido do Maranhão. Com toda certeza o zelador de santo chegou a essa conclusão consultando seus deuses e guias espirituais. Vale recordar que deles já havia recebido a mensagem de que o Senador tem o “corpo fechado”. Ketu,

Tetsuo Tsuji - um sumurai em terras do Maranhão

Esta semana faleceu meu querido amigo Tetsuo Tsuji (1941-2023), um sumurai em terras maranhotas. Nascido em 13 de julho de 1941 em São Paulo construiu sua carreira lá e no Maranhão. Neste espaço presto minha sincera homenagem. Formado em Administração Pública e Direito pela USP, mestre em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas-FGV e doutor em Administração pela USP. Tetsuo trabalhou na Secretaria de Finanças do Estado de São Paulo e foi professor na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP. Largou tudo e veio para Maranhão ser empresário na área de agricultura e pesca, formou família. A vida acadêmica volta na Universidade Federal do Maranhão-UFMA onde se tornou professor e reconstruiu carreira. No Maranhão foi pioneiro nos estudos de futuro e planejamento estratégico, contribuindo para o processo de planejamento do desenvolvimento no âmbito do Governo do Estado. É aqui que nos conhecemos, na experiência do Governo Jackson Lago (2007-2009). Tinha uns 2

A escola honesta

a) O que falta na escola pública? 69% não tem bibliotecas 91% não tem laboratório de ciências 70% não tem laboratório de informática 77% não tem sala de leitura 65% não tem quadra de esportes 75% não tem sala de atendimento especial São dados do Censo Escolar de 2022 e que acompanho há mais de 10 anos, afirmo com segurança, pouco ou quase nada mudou. b) E as propostas de solução? - formação continuada - flexibilidade curricular - gestão por resultados - avaliações de aprendizagem - plataformas a distância - internet Darcy Ribeiro finaliza um dos seus livros mais emblemáticos dizendo que nossa tarefa nacional é criar escola honesta para o povo. Quando?