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AJUSTE DE QUEM?



Jhonatan Almada, historiador, escreve as sextas-feiras no Jornal Pequeno


O debate em torno do ajuste fiscal coloca uma situação no mínimo insolvível. Por um lado, o Governo Federal é criticado por mandar orçamento com déficit. Por outro, o Congresso Nacional é criticado por não aceitar elevação de impostos para cobrir o déficit. A questão de fundo nessa gangorra e ainda intocada é o pagamento das emendas parlamentares que quando incorporadas ao orçamento aumentarão significativamente o déficit.

Nunca fomos um país de realismo orçamentário, talvez de ficção orçamentária. O orçamento em si sempre foi um exercício de fé e alguns raios de razão. Está assentado em estimativas de receita, quase sempre derivadas dos impostos. Partem do princípio de que tudo permanecendo conforme planejado, tudo dará certo. Logo em seguida, o Ministério do Planejamento e o Ministério da Fazenda contingenciam o orçamento. Pouco ou quase nada é liberado nos primeiros 8 meses do ano, muito é liberado nos últimos 4 meses, praticamente inviabilizando um gasto mais qualitativo e organizado. 

O mais curioso desse quadro político tumultuado e confuso é ver o PMDB, o mais cúpido dos partidos e o mais especializado em cargos e sinecuras pedir cortes no orçamento. Suponho que se referem a cortes nas despesas dos ministérios não geridos por seus integrantes. Também suponho que quando pedem corte do número de ministérios não se incluem nessa conta. Ver o PMDB sempre nutrido de Estado, pedir menos Estado é algo paradoxal demais para acreditar.

A economia retraída e o orçamento deficitário são seguidos de pedidos de aumento ou reajuste salarial. Os servidores públicos federais, tanto do Judiciário, como do Executivo, insensíveis à conjuntura, acreditam que de onde tem pouco, pode sair sempre mais. Argumentam que é só cortar as despesas com a corrupção, com o petrolão, com vergas de gabinete, com ministérios. É como se o Poder Executivo pudesse cortar do Judiciário e do Legislativo. Não pode. Cada um apresenta seu orçamento, cada um eleva seus salários. Ninguém pode sequer cogitar reduções. Os dois poderes candidamente dizem que a culpa é do Poder Executivo. Jornalistas dizem que a culpa é o do Poder Executivo. Leia-se Dilma, leia-se desgoverno, leia-se impeachment. 

Vamos às contas. O déficit do orçamento 2015 está estimado em R$ 30 bilhões. O orçamento da Câmara dos Deputados é de R$ 5,3 bilhões. O Senado Federal tem um orçamento de R$ 3,9 bilhões. O Poder Legislativo, portanto, consome R$ 9,2 bilhões. O Poder Judiciário, somando Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Justiça Federal, Justiça Militar, Justiça Eleitoral, Justiça do Trabalho, Justiça do Distrito Federal e Conselho Nacional de Justiça consomem R$ 38,3 bilhões.

O Tribunal de Contas da União consome R$ 1,8 bilhão. O Ministério Público R$ 530 milhões. O Conselho Nacional do Ministério Público consome R$ 91 milhões. Somados, os três consomem R$ 2,4 bilhões. 

Essas instituições são importantes para a efetivação da democracia representativa, para a aplicação da lei e fiscalização dos poderes, contudo, não é aceitável argumentar que somente o Poder Executivo deve realizar cortes, justamente nos programas sociais, (como o Minha Casa, Minha Vida, Ciência sem Fronteiras ou Pronatec), isentando os demais poderes e instituições de qualquer corte. Sabemos o quanto essas instituições têm fortes traços monárquicos, tanto simbólicos, quanto materiais, extremamente onerosos aos cofres públicos.

Não creio que os Poderes Legislativo e Judiciário terão esse ato de grandeza. Cortarem seus próprios orçamentos. O ajuste é só para os outros.

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