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AULA MAGNA - UNIVERSIDADE E DESENVOLVIMENTO REGIONAL



UNIVERSIDADE E DESENVOLVIMENTO REGIONAL

AULA MAGNA NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DA REGIÃO TOCANTINA DO MARANHÃO (UEMASUL)

Imperatriz, 13 de março de 2017


Senhores e Senhoras,

Uma grande noite para todos nós!


1 PRELÚDIO

Foi com grande felicidade que recebi o convite da Magnífica Reitora da Universidade Estadual da Região Tocantina do Maranhão (UEMASUL), Profª Drª Elisabeth Nunes, para proferir esta Aula Magna que abre o Calendário Acadêmico da mais nova Universidade do Brasil.

Todo começo tem o sabor das experiências únicas e irrepetíveis, este momento é uma delas. Pessoalmente estou emocionado por essa deferência a que atribuo menos aos meus méritos e mais à generosidade dos professores e estudantes desta nova Universidade ao me distinguir com tão alta tarefa. Sublinho minha gratidão a vocês, em nome do Vice-Reitor Prof. Expedito Barroso, a qual estará gravada no coração da minha memória e história.

Nesta Aula Magna trato das relações entre história e memória trazendo a baila minhas experiências de Universidade ao longo dos últimos 15 anos, tempo em que preservo esses vínculos e trabalhos.

O objetivo é extrair daí elementos para compreender o que chamo de busca desesperada, inspirado em Pablo Neruda, busca por decifrar os problemas e encontrar caminhos para o desenvolvimento do Maranhão, além de oferecer modestas, mas apaixonadas ideias a esta Universidade.

2 UNIVERSIDADE E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Minha primeira incursão acadêmica nesse mundo da Universidade foi com o artigo “Expansão e evasão nos cursos de graduação da UEMA” publicado em 2006 na Revista Pesquisa em Foco da mesma instituição.

Naquele texto analisei o quadro da educação superior no Maranhão onde se registrava o forte crescimento do setor privado ao longo da década de 1990, seguindo a tendência nacional advinda das políticas federais que retraíram os investimentos no setor público. Naquele momento, a UEMA respondeu sozinha por 68,4% da meta estabelecida pelo Plano Nacional de Educação (de 2001) para aumentar o número de matrículas, isso, sobretudo por intermédio dos programas de formação de professores em parceria com prefeituras.

A despeito disso, ao longo do período analisado somente 51% do orçamento da UEMA foi efetivamente liberado para a execução, enquanto crescia o número de matriculados, reduzia o per capita por estudante matriculado, assim as condições de infraestrutura e pessoal para prover cursos de qualidade se foram minguando.

A evasão média dos cursos da UEMA era de 21,3% especialmente nos cursos de Administração, História e Engenharia Civil, na amostra feita com estes estudantes, 44,5% apontavam a opção por outro curso (Direito, Enfermagem, Medicina etc) com maior prestígio social e remuneração. Uma das formas que sugeri para minorar o problema foi revisar os prazos de desligamento, realizar chamadas de excedentes, divulgar os cursos oferecidos e perfis profissionais esperados junto às escolas de ensino médio, bem como, melhorar o sistema de informação e acompanhamento dos estudantes.

É uma lástima que ainda não tenhamos pesquisas regulares de egressos, isso impede a criação de associação de ex-alunos e fundos próprios para doação à Universidade. Os chamados endowment funds[1] são prática corriqueira nos Estados Unidos e outros países, protegem as instituições das oscilações econômicas e políticas do entorno, o de Harvard possuía 36 bilhões de dólares no ano de 2016.

Não basta criar Fundações de Apoio, pois o doentio bacharelismo brasileiro e sua sanha legisferante deu um jeito de engessá-las também. Precisamos avançar para a criação de fundos próprios em que a Universidade exerça gestão privada dos recursos com a agilidade que ela precisa, ao mesmo tempo, caminharmos para os tão criticados modelos de organização social, por mim criticados também.

Entretanto, precisamos dar o braço a torcer, estão aí os institutos de pesquisa vinculados ao Ministério da Ciência e Tecnologia e ao Ministério da Educação caminhando com menos problemas que as nossas Universidades.

Olhando novamente esta primeira pesquisa na Universidade eu penso que existem questões intrínsecas não tratadas com o devido cuidado pelas instituições de ensino superior, a merecerem por parte da UEMASUL toda a atenção, a exemplo: formação continuada docente, atualização regular dos currículos dos cursos, internacionalização dos currículos, criação de diferenciais na formação oferecida e a busca por padrões elevados de qualidade na relação ensino-pesquisa.

Implantamos esse programa de formação continuada na Universidade Federal do Maranhão com relativo sucesso quando estive trabalhando na Pró-Reitoria de Ensino e funciona regularmente para os professores universitários em início de carreira.

Karl Marx mencionou isso na terceira tese sobre Feuerbach “o próprio educador precisa ser educado”, mas compreendo como é difícil convencer nossos professores universitários da verdade de que a vida acadêmica não termina na Tese de Doutorado, existem especificidades metodológicas e práticas do ensino a serem permanentemente discutidas em processos de formação e auto-formação.

Essas questões ligadas à formação me arrastaram para a pesquisa “Novas competências e fundamentos legais para a formação de professores – um estudo de caso na UEMA”, financiada pela FAPEMA por intermédio de Bolsa de Iniciação Científica e publicada na Revista Inovação Nº 5/2007. Eram tempos de escassas bolsas de pesquisa nas Universidades públicas, fui um sortudo talvez.

Basicamente analisei os principais autores que estudavam formação de professores e os documentos legais que a regulamentavam. Identifiquei os requisitos exigidos para uma boa licenciatura e os comparei com os projetos político-pedagógicos dos cursos do Centro de Educação, Ciências Exatas e Naturais (CECEN) da UEMA. Cheguei ao resultado de que 79% dos projetos contemplam os requisitos apontados pelos autores e 70% os requisitos exigidos nos documentos legais.

Isso não é novidade desde que Fábio Konder Comparato[2] criticou as diferenças entre o Brasil oficial e o Brasil real. Os projetos pedagógicos supervalorizavam os conhecimentos específicos e secundarizavam os conhecimentos ligados ao ensino e práticas pedagógicas, algo que as pesquisas do campo evidenciam há bastante tempo também.

O grande desafio continua sendo propor a formação dos professores da educação básica como centralidade dos cursos de licenciatura, formar professores que saibam de fato ensinar nas escolas e tenham condições intelectuais e profissionais de se aperfeiçoar na carreira, o foco é o direito de aprender.

Não está no nosso escopo de Universidade resolver o problema salarial que diz muito da atratividade da carreira de professor. No entanto, hoje no Maranhão pagamos o melhor salário de professor da educação básica do Brasil, a vinda de profissionais de outros estados no último concurso docente realizado atesta o quanto melhoramos no âmbito da valorização salarial.

Talvez ao longo dos próximos anos, a Licenciatura e a Profissão Docente possam superar os problemas apontados pelas pesquisas mais recentes, por um lado, os melhores alunos do ensino médio não optam pela carreira docente, por outro, aqueles com mais baixo desempenho acadêmico escolhem os cursos de licenciatura[3].

A UEMASUL poderia adotar pelo menos 1 escola de educação básica em cada município onde tenha campus e ali implementar toda uma concepção de licenciatura, constituindo assim sua Rede de Colégios Universitários como lugares permanentes para a relação teoria-prática na formação de professores.

Eis uma medida de custo zero a exigir criatividade, organização e articulação da Universidade com as Escolas. Assim interferiríamos de forma mais efetiva com as competências e sensibilidades de quem forma os formadores. Iniciar-se-ia processo que não se esgotará na colação de grau, mas se realimentará no espaço de atuação profissional para novas aprendizagens e aperfeiçoamentos no espaço de formação acadêmica, elidindo os tão criticados muros ou torres da Universidade em relação ao mundo real. Reitero, o educador precisa ser educado.

Não me queiram mal, não estou dando lições, mas partilhando ideias. Sei que nessa Universidade muitos solitários ou pequenos grupos fizeram e fazem muito pela formação de professores, lutando arduamente contra os modismos e insanidades dos dirigentes de plantão. Estou propondo que as iniciativas dispersas e os esforços solitários encontrem um veio institucional orgânico e central na missão da UEMASUL, prover formação de qualidade e diferenciada com alto padrão com o objetivo de influenciar as políticas educacionais, elevar os indicadores de desempenho e transformar a prática docente nas escolas. 

3 DA UNIVERSIDADE AO PLANEJAMENTO GOVERNAMENTAL

Ainda na Universidade participei da elaboração do Plano de Ação da instituição como um todo e do CECEN em particular, elencamos ali as metas da gestão 2003-2006 da então diretora professora Efigênia Magda de Oliveira Moura. Conseguimos realizar o diagnóstico situacional e a avaliação do Plano ao final da gestão. Foi um processo de grande aprendizado que me atraiu para o campo do planejamento, mas não pela primeira vez.

Quando saí da Universidade me envolvi no processo de planejamento governamental do Governo Jackson Lago ali desenvolvendo trabalhos como a nova regionalização, a descentralização administrativa, a cooperação internacional e a pesquisa aplicada ao planejamento, registrados nas publicações “Aspirações da Sociedade no Maranhão nas Regiões do Estado em 2017” e “Agenda 2010 – Maranhão Democrático e Solidário”, bem como, nos livros “Um Planejamento que marca caminhos”, “A singularidade do pensamento de Ignacio Rangel”, “O que o Maranhão quer ser quando for Grande” e os Cadernos IMESC.

Vivi a aventura de criar uma nova instituição, sei como isso é bom e instigante. Participei ativamente da equipe de criação do Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e Cartográficos (IMESC), órgão ainda hoje existente e vinculado à Secretaria de Planejamento e Orçamento. Ousadia dos navegantes que enxergaram a possibilidade de reconstruir uma escola de pensamento sobre o Maranhão para com ventos favoráveis levá-lo ao porto da prosperidade com justiça social.

A síntese dessa experiência está registrada no artigo “Alguns desafios ao desenvolvimento do Maranhão, Brasil: contexto histórico, obstáculos e estratégias de superação”, publicado na Revista Planejamento e Políticas Públicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), agradecendo, por oportuno, o professor Raimundo Palhano seu inspirador.

Afirmei que a superação do nosso histórico quadro de desmonte da capacidade estatal, concentração econômica, concentração/centralização do Estado e inexistência de alternância no poder político necessariamente passaria por um projeto de desenvolvimento estadual, capitaneado pelo Estado, com densidade e competência para atuar de forma efetiva; fortemente apoiado e fiscalizado pela sociedade; e articulado a amplo pacto social entre as forças de oposição, reunidas sob esse programa coletivo.

Algumas estratégias nesse sentido foram tomadas no Governo Jackson Lago, tais como: a recuperação do aparelho estatal, a desconcentração econômica, a descentralização da administração pública e a cooperação internacional, aos quais passo a mencionar de forma tópica e sintética.

A recuperação do aparelho estatal estava centrada na Reforma Democrática do Estado, cuja estratégia se desdobra em três eixos: o fortalecimento e a ampliação dos mecanismos de democracia direta e participativa; o fortalecimento da intersetorialidade das políticas públicas; e a reestruturação dos órgãos e das instituições do Estado para o desenvolvimento sustentável e em escala humana.

A lógica adotada pelo planejamento público estadual envolveu o redirecionamento dos investimentos e incentivos públicos, juntamente ao estímulo e à articulação dos investimentos privados para os outros municípios e regiões do Maranhão, subvertendo a histórica concentração na capital e estimulando novos polos de crescimento e novas atividades econômicas locais.

O desenlace dessa rica experiência já é conhecido. O Governo Jackson foi derrubado em abril de 2009 por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e fomos lançados no limbo por 6 anos, excluídos de qualquer possibilidade de contribuir com um projeto de desenvolvimento para o Maranhão.

4 UMA BREVE DIGRESSÃO

Faço então uma volta para quando eu tinha 17 anos, como na canção de Violeta Parra[4]. Quando recordo disso tudo vem à memória minhas incursões juvenis no campo do planejamento do desenvolvimento, ainda do tempo em que era um adolescente e estudante do nível médio na cidade de Caxias. Em meados dos anos 2000, elaborei o Plano Estadual de Desenvolvimento e o Plano Municipal de Desenvolvimento Econômico Social, frutos da minha inquietação gigantesca quanto aos problemas e soluções para a nossa difícil e injusta realidade.

Os dois planos colocavam o Estado como centro direcionador dos processos de desenvolvimento da sociedade, apesar de se inspirarem nas discussões dos programas de governo de Fernando Henrique Cardoso, os quais pregavam justamente o contrário, algo imperceptível para o adolescente de então, apesar das advertências incisivas do meu professor de inglês. A maturidade que veio com o tempo esclareceu esse equívoco e colocou em termos mais reais a ilusão neoliberal.

O Plano Estadual de Desenvolvimento previa seis subplanos: Recursos Financeiros Estaduais; Investimentos Sociais; Tecnologia e Pesquisa; Desenvolvimento Industrial; Sistema de Transportes e Agrícola. O de Investimentos Sociais, por exemplo, previa a criação de universidades regionais, programa de saúde no campo e serviço de inteligência. O de Tecnologia e Pesquisa previa a criação de polos tecnológicos e instituições nas áreas espacial, biotecnológica, naval, médica e do babaçu.

E não estão aí prenúncios da ora UEMASUL e da Rede de Institutos Estaduais de Ciência, Tecnologia e Inovação (IECTs) com foco nas áreas de biotecnologia, economia criativa e energias renováveis que estamos construindo e implantando com outros sonhadores?

Os Planos no fundo expressavam a vontade consciente de intervir na realidade para transformá-la e conduzi-la na direção que o planejador juvenil entendia ser a mais correta por gerar prosperidade econômica e inclusão social. Tantos anos depois continuo perseverando nesse rumo, obstinadamente acreditando que é possível mudar pela combinação de inteligência e ação.

5 DE VOLTA A UNIVERSIDADE, POR POUCO TEMPO

A roda da história é imprevisível. Reconheço que isso é um pouco inusitado, mas não excepcional e está dito aqui com o intuito de sublinhar meu interesse no tema.

Reinventei meu caminho na volta a Universidade, agora para a Universidade Federal do Maranhão (UFMA) com o objetivo de cursar o Mestrado em Educação. Minha dissertação se dedicou em analisar o planejamento público e educacional a partir das teorias existentes.

Logo após pude me inserir no ensino superior de pós-graduação, graças ao generoso convite de vocês da antes UEMA/CESI para ministrar disciplinas do Curso de Especialização em Metodologia do Ensino Superior. Parece que me saí razoavelmente bem, pelo menos assim os alunos e coordenação disseram. Nunca tive muita certeza por que não me convidaram mais. Por oportuno, agradeço aos professores Ilma Oliveira e Francisco Almada pela generosidade para comigo.

Concluído o Mestrado, atuei como professor do Ensino Médio na rede estadual e em seguida me tornei servidor federal da carreira técnica na UFMA. Entre os trabalhos que fizemos estão: Normas de Graduação da UFMA; Normas de Progressão e Promoção da Carreira Docente; Revista Ensino e Multidisciplinaridade; Fórum de Graduação; Reelaboração dos projetos pedagógicos dos Cursos de Licenciatura Interdisciplinares.

Foram trabalhos gratificantes que me reposicionaram na Universidade como profissional, dali comecei a tecer o fio de volta para contribuir com o desenvolvimento do Maranhão, nossa obsessão maior.

Meu livro “A alternância do poder no Maranhão: temas de um projeto político pós-Sarney” expressa o pensamento sobre a virada de 2014, com a eleição do Governador Flávio Dino. Algumas dessas ideias foram incorporadas ao programa de governo que ora implementamos e do qual participei da coordenação e elaboração nos Diálogos pelo Maranhão.

O Programa de Governo não é um documento que abrange todas as áreas e problemas. Mas, entre as áreas e problemas, prioriza o que efetivamente se buscará com afinco cumprir no horizonte de um mandato, deixando claro aquilo que será enfrentado depois. Planejar é discriminar o que vai ser contemplado agora e aquilo que será contemplado depois, discriminar positivamente o curto, o médio e o longo prazo. Em síntese, planejar é respeitar a inteligência alheia, evitando as frustrações de expectativas pelo permanente esclarecimento do plano de voo traçado.

No referido livro defendi e propus a criação de Universidades Regionais, entendendo que os princípios orientadores dessas novas instituições deveriam ser o desenvolvimento regional, a inclusão social e a cooperação internacional. Sediadas em cidades de importância regional e localização estratégica, teriam áreas de conhecimento prioritárias e deveriam escolher um Patrono entre maranhenses já falecidos que tiveram grande destaque em sua contribuição política, social ou intelectual. 

As questões centrais que essas Universidades buscariam responder são: 1) como empreender uma formação que contribua para o processo de desenvolvimento econômico regional tornando-o socialmente inclusivo e politicamente emancipador? 2) como empreender uma formação que contribua para a humanização e a efetividade das políticas públicas articulando-a a um desenvolvimento socialmente inclusivo, politicamente emancipador e culturalmente rico? e 3) como empreender uma formação que reforce os laços de solidariedade internacional entre o Brasil e os países do Sul fazendo emergir um novo sentido de humanidade?.

Essas seriam as questões mobilizadoras de sua comunidade acadêmica, inscritas na sua missão institucional e nos seus Estatutos fundadores.

Afirmei ainda que as cidades de Imperatriz, Balsas, Pedreiras, Pinheiro e Caxias poderiam sediar essas instituições com atuação na área de ciências tecnológicas, ciências da terra, ciências da saúde, ciências sociais aplicadas, ciências humanas e relações internacionais. O cerne é ter um foco claro, não dá para ser bom em tudo, fatalmente nos tornaremos diletantes.

Não é nosso objeto relatar o trabalho desenvolvido na Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação do Governo Flávio Dino, a revista Maranhão Ciência que vocês têm em mãos serve para tal. A UEMA, a FAPEMA, a UEMASUL e o IEMA são nossas instituições vinculadas. Tocamos o Programa Cidadão do Mundo, intercâmbio internacional para estudantes universitários; o Programa Luminar Caravana da Ciência, oficinas de ciência e Planetário para estudantes da educação básica, e o Programa Pré-Universitário/Aulão do Enem para estudantes do 3º ano do nível médio que desejam ingressar na Universidade.

O mais importante é o trabalho de implantação do Instituto Estadual de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IEMA), primeira rede de educação profissionalizante de tempo integral do governo, saímos de zero unidade em 2015 para sete unidades em 2017. Nossa meta é chegar a 23 até 2018.

O que estava previsto no programa de governo foi feito em 2014. Estamos em 2017 e a Universidade Estadual da Região Tocantina do Maranhão, a UEMASUL, já é uma realidade desafiadora e instigante para que sua comunidade institucional em sintonia com sua região explicite qual projeto novo traz e como fará diferença em relação ao existido.

6 UEMASUL PARA O DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Darcy Ribeiro viveu muitas experiências de criação de Universidade no Brasil e no mundo, plantando ou movendo instituições, ciente de que:
Criar uma nova universidade é um privilégio extraordinário, provavelmente o mais honroso e o mais gratificante para um trabalhador da educação. Mas é, também, o mais desafiante, tanto pela complexidade do tema, como pela tentação de, criando sobre o vazio, sair a propor utopias desvairadas[5]. 

Darcy e eu só temos uma coisa em comum, ele amava e eu continuo amando Gal. A despeito desse detalhe, a UEMASUL não nasce sobre o vazio, traz consigo uma carga histórica que saberá lidar. A UEMASUL precisa INOVAR no modelo de atuação da educação superior pública estadual em Imperatriz e região para se tornar REFERÊNCIA na primeira década de sua existência, levando em conta o experimentado no Brasil e no mundo.

Uma primeira contribuição foi o Seminário de Implantação de Instituições de Ensino e Pesquisa em que trouxemos como contribuição os modelos institucionais da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) e Universidade Federal do ABC (UFABC) para levantarmos pistas dos caminhos para a UEMASUL.

A segunda contribuição foi a criação do Centro Ignacio Rangel de Estudos do Desenvolvimento (CRangel), vinculado à nossa Secretaria, cujo Edital da FAPEMA para seu fortalecimento prevê a alocação de pesquisadores recém-doutores na UEMASUL com o objetivo de discutir a temática dos desafios e estratégias de superação do desenvolvimento.

A terceira contribuição virá por intermédio do Edital PROLAB da FAPEMA com percentual específico para a implantação de infraestrutura de pesquisa da UEMASUL. Assim, estarão dispostas as condições propícias para a pesquisa e a pós-graduação se consolidarem.

O desenvolvimento regional será a nova fronteira para construir os diferenciais de atuação da UEMASUL. É sabido por todos nós que o conhecimento científico e tecnológico se tornou fator determinante para os novos padrões de acumulação e reprodução da riqueza, tendo as Universidades como atores centrais dessa transformação produtiva que se acelerou nas últimas décadas[6].

A questão é como superar a rejeição do lugar provocada pelas orientações universalizantes da produção de ciência e mobilizar a Universidade a favor do lugar onde está sediada para contribuir com o enfrentamento das desigualdades ali instaladas.

Isso se dá sob duas formas principais: encadeamentos para trás e encadeamentos para frente. Os primeiros implicam os dispêndios diretos da Universidade, salários, prestadores de serviços, consumo de estudantes e professores, investimentos em equipamentos e serviços estimulando a demanda local das famílias, governos e empresas. Os segundos se referem a produção do conhecimento científico que se materializam na qualificação profissional, interação Universidade-setor produtivo e atratividade local de indivíduos e empresas.

A interação Universidade-setor produtivo é uma grande lacuna que a UEMASUL poderá pioneiramente superar. Nós criamos a política de estímulo aos Institutos Estaduais de Ciência e Tecnologia (IECTs), modelo local dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs), cujo objetivo é focalizar os investimentos em pesquisa alocados pela FAPEMA nas áreas de interesse do Estado.

A UEMASUL pode trazer a empresa Dois Irmãos e propor um IECT na área de alimentos ou dialogar com a empresa Suzano Papel e Celulose e propor um IECT na área de recursos florestais. Não tenham medo das empresas, façam com que elas implantem Centros de Pesquisa na Universidade e demandem conhecimento para que nosso país deixe de se vangloriar da soja, como fazíamos no Império com o café, e possa gerar valor agregado aos seus produtos, riqueza e empregos mais dignos.

Aguardo ansiosamente as primeiras propostas de IECTs vindas da UEMASUL. Os IECTs são a ponte entre ciência e economia para solucionar problema não enfrentado de forma prática pelo Brasil até hoje e menos ainda no Maranhão. Quem tem poucos recursos não se pode dar o luxo de em tudo gastar, focalizar o investimento em pesquisa é necessário para sairmos do beco das commodities. 

Está patente que a expansão da educação superior na última década reduziu a concentração das matrículas, instituições, programas de pós-graduação e produção científico-tecnológica do Sul/Sudeste do Brasil em benefício do crescimento no Norte/Nordeste. Claramente isso se deu pela criação de mais Universidades Federais e Institutos Federais, juntamente com as bolsas do Programa Universidade para Todos (PROUNI). Movimento gestado pelo Governo Lula e oposto ao que observei na década de 1990.

A União Europeia elaborou importante estudo em que nos traz boas práticas para conectar Universidades e o Desenvolvimento Regional[7] a partir de quatro chaves para tornar essa interação engajamento: melhorar a inovação regional através de suas atividades de pesquisa; promover o desenvolvimento e o crescimento das empresas; contribuir para o desenvolvimento do capital humano e habilidades; e melhorar a equidade social através do desenvolvimento comunitário.

Essas chaves operam em uma gradação que vai do mais simples ao mais complexo, conforme a maturação das conexões estabelecidas pelas Universidades e seu entorno.

A primeira chave pode ser implementada com serviços de consultoria, bolsas de inovação, parcerias de transferência do conhecimento, parques tecnológicos e centros de pesquisa. Eis a ideia do Centro de Excelência na Formação de Professores, os IECTs e os Centros de Pesquisa em parceria com as empresas, mencionados anteriormente.

A segunda chave se dá pelo empreendedorismo, oportunidades de negócios a partir das pesquisas produzidas, estímulo ao desenvolvimento de setores industriais específicos, propriedade intelectual e ligações internacionais. Eis aqui empresas juniores, o foco em pesquisa aplicada, o registro de patentes e a integração com redes internacionais.

Só recentemente o Brasil tem buscado transpor o abismo entre pesquisa e produção, a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (EMBRAPII) tem esse objetivo ao selecionar e financiar Centros e grupos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação com capacidade técnica para atuar nas demandas das empresas, gerando soluções tecnológicas com ênfase na inovação. 

Para citar um exemplo próximo. A Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) tem um grupo na área de Software e Inovação apoiado pela EMBRAPII que se relaciona diretamente com empresas globais internalizando os ganhos com a produção do conhecimento e registro de patentes.

A terceira chave diz respeito a formar pessoas com conhecimento e habilidades que contribuam para o desenvolvimento regional, isso se dá pela oferta de cursos que tenham sintonia e flexibilidade com as demandas de emprego e empresas na região, mobilidade estudantil e docente, atração e retenção de talentos.

A Universidade não pode oferecer para sempre os mesmos cursos ou abrir cursos a partir do “achismo” como já vi ocorrer inúmeras vezes em universidades públicas e privadas. Daí a relevância de fazer pesquisa de egressos, estudos regulares do mercado de trabalho e trazer os atores sociais para dentro do planejamento da oferta futura.

Instituir burocracia acadêmica que atrapalhe, impeça ou bloqueie a mobilidade acadêmica é ferir de morte o enriquecimento que ela traz para a Universidade. Tenho na memória a dificuldade dos estudantes que retornavam do Programa Ciência sem Fronteiras para a UFMA em obter dos departamentos e cursos o reconhecimento dos programas que fizeram no exterior, a tal ponto que eu tive que propor uma tabela de conversão de notas para diminuir o problema.

Mesmo os estudantes que realizaram intercâmbio no Programa Cidadão do Mundo, criado pelo nosso governo, tiveram que enfrentar a má vontade acadêmica instituída, ora para não liberá-los, ora para reprová-los quando voltavam. A UEMASUL precisa ter sua política de mobilidade acadêmica nacional e internacional agressiva e sem as amarras dos burocratas doidos demais e mais importante: a comunidade acadêmica deve ser bilíngue, uma meta a ser cumprida no primeiro ano de qualquer graduação oferecida.

Melhorar a equidade social através do desenvolvimento comunitário é a quarta chave que se materializa com trabalho comunitário e ações voluntárias, ampliação da participação de estudantes de grupos sociais sub-representados e desenvolvimento cultural no local.

Precisamos superar a forma de atuação nos municípios que se restringe a oferecer formação de professores da educação básica. A UEMASUL precisa avançar para além, no veio das possibilidades abertas por ser uma instituição nova, portanto, atenta ao que ocorre no mundo. Por exemplo, nos ajudando a implantar a Rede Ciência Maranhão e a Agenda de Municipalização da Ciência e Tecnologia na Região.

Inconcebível que uma Universidade multicampi precise de bolsas de extensão para realizar ações comunitárias nos municípios em que tem sede. É questão de coordenar e alinhar currículo, carga horária e projetos instituintes para criar ações de alfabetização, campanhas educativas, reforço escolar, consultorias e atendimentos gratuitos.

O Projeto SAUCE (Escolas e Universidade pelo Clima e a Energia) na Alemanha desenvolve ações nas escolas primárias, secundárias e de educação superior para a responsabilidade com os recursos naturais e o uso sustentável de energia, estimulando e reconhecendo soluções inteligentes que façam uso eficiente, reutilização e economia de energia. Tragam a CEMAR para dentro da UEMASUL em projeto nessa linha.

É como se a solidariedade, melhor dizer a fraternidade só fosse possível no modelo do programa Criança Esperança em que eu pago para os projetos serem executados, isto é, delegando minha solidariedade por intermédio do dinheiro. Ligo, pago, fiz minha parte. Sem dinheiro, não existem projetos.
É possível estabelecer carga horária anual obrigatória em ações voluntárias e trabalho comunitário, passíveis de enquadramento na esfera da extensão universitária, para que estudantes e professores criem iniciativas similares e de fato superemos a rejeição do lugar.

A UEMASUL tem condições de se tornar referência na Educação Indígena, vocês são bons nisso, transformem em projeto instituinte, para que finalmente o saber tradicional dialogue com o saber acadêmico. Isso é uma forma de integração e interação com o entorno regional que trará frutos de repercussão internacional para a instituição.

Senhoras e Senhores,

7 A BUSCA CONTINUA

Para encerrar esta Aula Magna, quero relembrar com vocês as três lealdades a que Darcy Ribeiro se refere em seu Discurso Inaugural da Universidade de Brasília (UnB) para que a UEMASUL as tenha em alto lugar de reflexão e prática.

A primeira lealdade é aos padrões internacionais do saber acadêmico, esses padrões tem que estar impregnados em tudo que a UEMASUL oferecer. Graduação, Especialização, Mestrado e Doutorado com qualidade do ensino, pesquisa relevante e extensão ativa, atrair os melhores professores para os quadros da Universidade, estimular os melhores estudantes que tenham interesse na carreira acadêmica a continuarem seus estudos e no futuro próximo se integrarem à instituição.

Jamais abrir cursos por abrir, por uma operação cerebrina sem nexo com a realidade. A capacidade instalada, as necessidades, as condições e a previsão de investimentos devem existir ou por vir. Se o curso for aberto, exigir alto padrão na oferta, não para ser o curso bom, mas ser o melhor da região sempre.

Ignacio Rangel nos dá pistas importantes ao afirmar que seu melhor curso de economia foi trabalhar na empresa Martins & Cia em São Luís, acompanhando todo o processo de produção. Precisamos, portanto, recuperar os nexos teoria-prática de forma permanente, impensável que o Curso de Administração não esteja dentro do Grupo Mateus conhecendo a logística de distribuição e venda de mercadorias, auxiliando na solução de problemas ali postos.

Não defendo a pátria do saber utilitarista, mas o equilíbrio entre a inquietação anárquica e livre necessária para a busca pelo saber e a responsabilidade de servir ao nosso povo que acredita na Universidade como instrumento de transformação social, precisamos corresponder a essa fé.

A segunda lealdade diz respeito ao lugar como causa. O Brasil e o Maranhão são nossas causas. Imperatriz e região é a causa da UEMASUL. Por isso minha insistência para que os vínculos sejam reforçados, criados onde não existam e alimentados pela inquietação da Universidade, assumindo ela também a busca desesperada.

Nós somos a pátria da desigualdade e a Universidade não pode ignorar isso, como se nada lhe tocasse. Contribuir para essa guerra diária de superação das desigualdades constituirá a missão mais honrosa e mais bela da UEMASUL.

Por isso, teremos aqui um Núcleo do Centro Ignacio Rangel de Estudos do Desenvolvimento para fomentar essa busca, encontrar caminhos, abrir diálogos e integrar os esforços de todas as áreas, ao filósofo não convém somente interpretar o mundo, a nossa realidade exige que ele se engaje na busca pela mudança.

A terceira lealdade é o respeito recíproco e a tolerância, nunca perseguir professor ou estudante por sua ideologia, mas premiar e reconhecer o mérito. Não podemos rejeitar o mérito, mas valorizá-lo em suas dimensões éticas e produtivas de ensino, pesquisa e extensão. A UEMASUL deve usar com sabedoria seus títulos honoríficos e reconhecer nos seus quadros, aqueles e aquelas que por seu mérito contribuem para realizar sua missão.

A UEMASUL poderia criar o Prêmio Adalberto Franklin de Mérito Acadêmico-Científico e com ele distinguir seus professores e estudantes que contribuam para a superação das desigualdades e problemas de Imperatriz e região, homenageando esse importante intelectual que muito fez pela ciência e a cultura.

Tudo dito.

Um grande e fraterno abraço!

Viva a UEMASUL!

Viva o povo do Maranhão!




[1] SPALDING, Erika. Os Fundos Patrimoniais Endowment no Brasil. 2016. 133 f. Orientador: Emerson Ribeiro Fabiani. Dissertação (mestrado). Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas.
[2] COMPARATO, Fábio Konder. O direito e o avesso. Estud. av.,São Paulo, v. 23, n. 67, p. 6-22, 2009. Disponível em
[3] LOUZANO, Paula et. al. Quem quer ser professor? Atratividade, seleção e formação docente no Brasil. Estudos em Avaliação Educacional, São Paulo, v. 21, n. 47, p. 543-568, set./dez. 2010.
[4] Volver a los diecisiete después de vivir un siglo. Es como descifrar signos sin ser sabio competente. Volver a ser de repente tan frágil como un segundo. Volver a sentir profundo como un niño frente a dios.
[5] RIBEIRO, Darcy. O Brasil como problema. São Paulo: Global, 2015, p. 176.
[6] VIEIRA, Danilo Jorge. Evolução do ensino superior brasileiro em período recente: novas perspectivas para o desenvolvimento regional? In: NETO, A. M., CASTRO, C. N. de; BRANDÃO, C. A. Desenvolvimento regional no Brasil: políticas, estratégias e perspectivas. Brasília, DF: Ipea, 2017.
[7] EUROPEAN Union Regional Policy. Connecting Universities to Regional Growth: a practical guide – a guide to help improve the contribution of universities to regional development. September, 2011. Disposível em: http://ec.europa.eu/regional_policy/sources/docgener/presenta/universities2011/universities2011_en.pdf.

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BANQUE O DURO, MEU CHEFE

BANQUE O DURO , MEU CHEFE ! Por Raimundo Palhano Não deixe o seu lugar. Foi o conselho do venerável Bita do Barão de Guaré ao presidente do Senado, José Sarney, que, ao que parece, está sendo levado extremamente a sério. Quem ousaria desconsiderá-lo? Afinal, não se trata de um simples palpite. Estamos frente à opinião de um sumo sacerdote do Terecô, um mito vivo para o povo de Codó e muitos outros lugares deste imenso Maranhão. Um mago que, além de Ministro de Culto Religioso, foi agraciado pelo próprio Sarney, nos tempos de presidência da República, com o título de Comendador do Brasil, galardão este acessível a um pequenino grupo de brasileiros. Segundo a Época de 18.02.2002, estamos falando do pai de santo mais bem sucedido, respeitado, amado e temido do Maranhão. Com toda certeza o zelador de santo chegou a essa conclusão consultando seus deuses e guias espirituais. Vale recordar que deles já havia recebido a mensagem de que o Senador tem o “corpo fechado”. Ketu,

Tetsuo Tsuji - um sumurai em terras do Maranhão

Esta semana faleceu meu querido amigo Tetsuo Tsuji (1941-2023), um sumurai em terras maranhotas. Nascido em 13 de julho de 1941 em São Paulo construiu sua carreira lá e no Maranhão. Neste espaço presto minha sincera homenagem. Formado em Administração Pública e Direito pela USP, mestre em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas-FGV e doutor em Administração pela USP. Tetsuo trabalhou na Secretaria de Finanças do Estado de São Paulo e foi professor na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP. Largou tudo e veio para Maranhão ser empresário na área de agricultura e pesca, formou família. A vida acadêmica volta na Universidade Federal do Maranhão-UFMA onde se tornou professor e reconstruiu carreira. No Maranhão foi pioneiro nos estudos de futuro e planejamento estratégico, contribuindo para o processo de planejamento do desenvolvimento no âmbito do Governo do Estado. É aqui que nos conhecemos, na experiência do Governo Jackson Lago (2007-2009). Tinha uns 2

A escola honesta

a) O que falta na escola pública? 69% não tem bibliotecas 91% não tem laboratório de ciências 70% não tem laboratório de informática 77% não tem sala de leitura 65% não tem quadra de esportes 75% não tem sala de atendimento especial São dados do Censo Escolar de 2022 e que acompanho há mais de 10 anos, afirmo com segurança, pouco ou quase nada mudou. b) E as propostas de solução? - formação continuada - flexibilidade curricular - gestão por resultados - avaliações de aprendizagem - plataformas a distância - internet Darcy Ribeiro finaliza um dos seus livros mais emblemáticos dizendo que nossa tarefa nacional é criar escola honesta para o povo. Quando?