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O IMESC COMO AUDÁCIA DOS NAVEGANTES

O IMESC COMO AUDÁCIA DOS NAVEGANTES

Jhonatan Almada, historiador e ex-assessor do IMESC

O poeta Antonio Machado nos lembrava que tudo passa e tudo fica. Nosso papel é continuar passando e fazendo novos caminhos, como audazes navegantes. Assim senti em retrospecto a aventura de re-fundação do Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e Cartográficos-IMESC, no Governo Jackson Lago (2007-2009), que muito me honra ter participado atendendo ao convite do seu presidente Raimundo Palhano, liderança esclarecida que à navegação conduziu e partilhou.

Os navegantes da audácia reuniram gerações diferentes, por vezes divergentes, mas comungaram do horizonte: re-fundar a pesquisa aplicada ao planejamento do desenvolvimento do Maranhão. Não foi pouca coisa soerguer a tradição de produção em pesquisa econômica e social iniciada nos anos 1970 pelo complexo IPEI, FIPES e IPES. Essa tradição institucional interrompida, esvaziada e extinta pelos governos do grupo Sarney, cujo tiro de quase morte coube ao Governo Roseana Sarney, que o fechou no ano de 1998.

A combinação de gerações dispôs no IMESC a mescla entre maturidade e juventude, experiência e experimentação, cujo resultado mais concreto está na construção de uma Base de Dados socioeconômicos e cartográficos. Essa base reuniu as informações sobre o Maranhão que estavam dispersas em variadas fontes e instituições como IPEA, IBGE, MEC/Inep e Datasus. Os pesquisadores e estudiosos da realidade maranhense puderam acessar com facilidade e objetividade algo que só era possível após longo esforço de coleta em uma miríade de fontes.

O Governo Roseana descontinuou, como já esperado, o Banco de Dados do Maranhão. Esse descontinuamento é expressão de parte da sociabilidade maranhense, um pouco da brasileira também, cuja marca é valorizar o aparente e não o essencial, o acessório e não o principal, as demonstrações da mulher de César e não o que de fato ela seja.

O IMESC desde seus começos transcendeu a missão que lhe destinara sua lei instituidora. Para além de produzir dados e informações estatísticas, atuou na elaboração e execução de políticas públicas estratégicas para o Governo Jackson Lago, sobretudo a regionalização e a cooperação internacional.

Em relação à primeira: coordenou os estudos técnicos que construíram as condições materiais e objetivas para sua execução nas 32 regiões do Estado do Maranhão, ou seja, a descentralização e democratização das estruturas do governo para as regiões, todas focadas no desenvolvimento dos municípios. A população iria efetivamente decidir no que, onde e como o recurso estadual seria gasto. Era o começo do fim da caixa preta orçamentária e financeira, cuja revelação aterrorizava o grupo Sarney. Muitos técnicos e militantes históricos do desenvolvimento sustentável pontificaram nessa experiência de vanguarda, em prova cabal da força e riqueza das inteligências locais.

Quanto à segunda: apoiou e participou da implementação da inédita política de cooperação internacional do Governo Jackson Lago, pioneira em relação a todos os governos pretéritos. Essa política iniciou relações amistosas e potenciais com China, França, Cuba, Venezuela, Equador, Uruguai e Argentina. Foi o início da desprovincianização do Maranhão, mantido isolado do mundo durante quatro longas e cansadas décadas. Não foram poucas as críticas duvidando dos ganhos imediatos dessa política, a despeito das vantagens comerciais e culturais obtidas. Aqui a figura inspiradora de Neiva Moreira desponta ladeada pelo trabalho articulador e infatigável de Beatriz Bissio.

O IMESC implantou arrojado programa de pesquisa e plano editorial retomando os estudos conjunturais, inaugurando os estudos de limites geográficos e georeferenciamento, os anuários estatísticos, revista digital, site interativo, estudos sociais, econômicos e ambientais sobre o Maranhão. A materialização da mescla das inteligências maduras e recentes ficou registrada em publicações editadas e internacionalmente indexadas pela Editora do instituto, hoje descontinuada. É importante destacar que toda produção institucional foi disponibilizada gratuitamente na internet.

O tempo nos foi desfavorável. Não conseguimos apesar do esforço de gigantes, realizar concurso público e concretizar a carreira de pesquisador do IMESC, deixando o órgão à mercê dos interesses limitados, conhecidos e provincianos do governo Roseana, que só não reeditou a extinção pela necessidade de preservar um verniz de tolerância. Mas se os estudos e pesquisas ainda ocorrem, é porque ficaram circunscritos ao mero levantamento estatístico. Mesmo isso, graças ao empenho dos sobreviventes da navegação venturosa que lá ficaram e não dos que entraram no navio a meio mar.

Celso Furtado nos ensinou que economia sem ciência social é pura álgebra. O IMESC, apesar de preservar as linhas e projetos fundamentais elaborados, desenvolvidos e consolidados no Governo Jackson Lago, regrediu tanto no que seus antecessores institucionais avançaram quanto no que foi reconstituído por força de sua refundação.

O IMESC, enquanto o Governo Jackson Lago se manteve, funcionou como grande casa de idéias e ações em prol do desenvolvimento maranhense cuja animação e movimento estiveram focados na transformação qualitativa do Estado.

É no mínimo incoerente que o Governo Roseana assuma como seu algo que não está nas preocupações reais da oligarquia no poder. Sua prática, agora reeditada, se baseia nas terceirizações e contratações de grandes consultorias nacionais. Os estudos produzidos nessa perspectiva são descolados da realidade maranhense, mas cumprem uma função acessória e midiática que lhe é fundamental, porém, estão distantes dos problemas e desafios concretos do estado.

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