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O PLANEJAMENTO AUTORITÁRIO ESTÁ DE VOLTA

O PLANEJAMENTO AUTORITÁRIO ESTÁ DE VOLTA

Não é coincidência que Camões, séculos atrás, enxergava: “e vê do mundo todo os principais que nenhum no bem público imagina; vê neles que não têm amor mais que a si somente; amam somente mandos e riqueza, simulando justiça e integridade”. Os gastos “excessivos” com mídia no atual desgoverno maranhense ficam mais pungentes em vista do que falam e do que calam.


O velho estilo de governar a aplicação dos recursos públicos está de volta. Esse estilo se caracteriza pela decisão de uns poucos sobre muito. O planejamento autoritário e tecnocrático dos tempos da Ditadura Militar de 1964 desembarca no Maranhão novamente, como de praxe nos governos da oligarquia, sobretudo os de Roseana. Autoritário por que decidido de cima para baixo sem ouvir a população e ignorando seus anseios e demandas. Tecnocrático por que elaborado e acompanhado por um pequeno núcleo técnico “especializado”, como se a coisa pública fosse inacessível e complicada aos “leigos”. Atentar para as aspas.


Esse velho estilo se caracteriza pela importação de técnicos de vários lugares do país para exercerem funções que os maranhenses, na concepção da oligarquia, não têm condição de exercer, não tem preparo. Lembranças dos que se fizeram no Maranhão com essa prática, isto inclusive produziu aquela expressão arraigada na mentalidade da subelite local: só quem ganha dinheiro aqui é esse pessoal que vem de fora, os maranhenses são muito acomodados.


De tudo que já li sobre o Governo Jackson Lago, críticas de fora e de dentro, todas calaram sobre uma Revolução fundamental iniciada por ele. A primeira foi a utilização de quadros técnicos e políticos locais na condução governamental. Abriu-se oportunidade para uma nova geração de maranhenses exercer as funções públicos e o poder político, renovando os quadros defasados, oxigenando a máquina primária do governo.


O grande diferencial dessa abertura geracional do Governo Jackson Lago foi que a maioria não pertencia a nenhuma das famílias tradicionais que há décadas se comportam como cracas nos navios, se produzindo e reproduzindo à custa da máquina estatal, basta lembrar que os restaurantes da capital lotaram no dia depois do golpe.


A segunda foi a implantação de forma intensa e tecnicamente consistente do planejamento participativo, democrático e popular. Nenhum dos planos lançados no Governo Jackson Lago, cuja execução estava ocorrendo, interrompidos por força do golpe judicial de 2009, foi elaborado sem ouvir e acatar as decisões da população, da sociedade nos Fóruns da Sociedade Civil, nas Oficinas de Planejamento Regional, nos Conselhos Estaduais de Políticas Públicas, nas Reuniões ampliadas nos Bairros, etc.


Certa visão crítica quis enxergar defeitos ou contradições neste planejamento, sem perceber a unidade da diversidade. A comunidade política que decidia no Governo foi significativamente ampliada com novos atores, além dos políticos e técnicos do governo: incluiu os principais interessados e destinatários das políticas, o povo.


Naquele momento pensávamos como Juscelino em relação a democracia. Imaginávamos que o planejamento democrático estava definitivamente consolidado no Maranhão, o que o lançamento de um plano equívoco pelo Governo Roseana comprovou que não.


O Plano dos 100 dias, o Plano Estratégico de Desenvolvimento, o Plano Popular de Desenvolvimento Regional, os Projetos Estruturantes de Desenvolvimento foram abandonados e deram lugar a um Plano de Desenvolvimento Estrutural-PDE que se diz equivalente ao Programa de Aceleração do Crescimento-PAC, certamente, tal como ele, a execução ficará para o próximo governo ou não chegará aos 40%.


O mais trágico, não cômico, é que seu lançamento será acompanhado de malabarismos estatísticos financeiros que pretendem demonstrar que tanto as despesas de pessoal como o endividamento público estão sob controle: qualquer curioso pode consultar as bases de dados da Secretaria do Tesouro Nacional e ver o que fizeram entre 1994 e 2001 nesta matéria, e assim intuir o que resultará dos empréstimos contratados com o BNDES.


É lamentável que numa das mais duradouras trajetórias democráticas da história brasileira, a população maranhense, aceite ou nem tome conhecimento de um plano que versa sobre seu desenvolvimento, sem nada lhe ter perguntado a respeito. Governar é planejar ao velho estilo.

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