Pular para o conteúdo principal

A AGENDA DO IMPEACHMENT

Jhonatan Almada, historiador.

Avança no Brasil um clima de impeachment como fato consumado. Percebo ainda uma enorme preocupação do lado que se pretende vencedor. Necessitam reforçar esse clima e ao mesmo tempo apelar para a pacificação dos ânimos, sinalizando que ao final do golpe institucional todos devem aceitar a nova situação como inelutável. O lado que está na luta contra o impeachment persevera na mobilização social e na utilização da sua maior força, o argumento-chave, estão derrubando um governo por impopularidade sem que a Presidenta da República tenha cometido qualquer crime.

Caso o impeachment seja efetivado, nenhum Presidente da República no Brasil terá estabilidade política para governar, pois diferentemente de Collor em 1992, não haverá mais necessidade de crime ou indício de crime de responsabilidade. É só combinar problemas econômicos, base política insatisfeita e pesquisas de opinião desfavoráveis para derrubar o Presidente. Os deputados federais do Congresso Nacional não estão atentos às consequências por que pressionados por investigações policiais, assédio midiático e pressão popular. Estão submersos no imediatismo.

Se no Império tivemos o parlamentarismo às avessas, pois o Imperador era que destituía e montava os gabinetes, na atual conjuntura, confirmando-se o impeachment, os deputados federais estarão impondo outro regime de governo. Na prática estão esvaziando o poder do Presidente e impondo um presidencialismo às avessas. O Presidente se tornará muito mais refém do apoio do Congresso Nacional e não conseguirá escapar aos interesses fragmentados e personalíssimos dos parlamentares. É a impossibilidade de um projeto nacional.

Outra consequência disso é negação da agenda progressista da última década, tanto do ponto de vista das políticas sociais exitosas, quanto dos avanços no campo dos direitos humanos. Avançará uma agenda de intolerância, misoginia e fanatismo que tentará subverter as conquistas. Claramente que haverá resistência firme e incansável daqueles que nasceram à luz da agenda progressista. Não será um passeio no parque, mas um périplo por campo minado.

O Brasil não é um país de principiantes. Parlamentares com folha corrida mais extensa que os andares do Congresso se vestem de verde-amarelo e posam como salvadores da pátria, combatentes da corrupção e moralizadores da política. É cômico e trágico por que apesar da grande mobilização das universidades, intelectuais, movimentos sociais, sociedade civil, igrejas e artistas, esses parlamentares estão encantados com a perspectiva de poder e ignoram solenemente tudo.

A Polícia Federal, o Ministério Público Federal e a Justiça Federal crentes de fazerem uma limpeza do país, não só verão seus esforços irem por água abaixo, como nunca mais conseguirão fazer metade do que fizeram nos governos de Lula e Dilma. Essas instituições também seduzidas pela possibilidade de punir um dos campos políticos, verão o campo conservador lhes escapar por entre os dedos. Os bacharéis em questão são tão imbuídos do poder, quase uma roupa que colocam ou retiram conforme sua vontade, que não perceberam a própria ingenuidade.

O campo conservador que está no poder, governando hora com o PSDB, hora com o PT, hora com qualquer um, nem de longe serão atingidos, tem mandatos e bases políticas sólidas. Eles assumiram o Brasil depois da ditadura de 1964, comandaram a transição democrática e estão invariavelmente no poder desde então. Só os ingênuos da PF e do MPF imaginam tê-los com as calças na mão.

Mas o que será essa agenda conservadora que virá caso esse disparate se concretize? Primeiro, fim das vinculações constitucionais para a educação e a saúde, conquista da Constituição de 1988 que, apesar dos problemas de qualidade dos serviços, garantiu a quase universalização do acesso ao ensino e ao atendimento médico. Segundo, o fim das indexações, sobretudo a que vincula salário mínimo com aposentadorias. Os aposentados não receberão mais os reajustes anuais do salário mínimo. Terceiro, elevação da idade mínima para se aposentar. Quarto, abertura do pré-sal para as empresas multinacionais. Isso irá progressivamente enfraquecer a Petrobrás até que possa ser privatizada como o foi a Vale. Quinto, flexibilização dos direitos trabalhistas, isso significa que os acordos coletivos de trabalho prevalecerão sobre os direitos dos trabalhadores, assim se preverem fim do décimo terceiro ou do terço de férias não haverá qualquer impedimento legal. Sexto, fim da política externa independente, preferência total à submissão ou alinhamento automático aos Estados Unidos e União Europeia.


Esses seis pontos entrarão em prática e serão sentidos por aqueles que utilizam os serviços públicos de educação e saúde, da educação infantil ao ensino superior, bem como, os aposentados que serão os mais penalizados. Não é o fim, mas o começo do fim de um círculo positivo cujos sinais de esgotamento foram ignorados. 

Comentários