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Márcio Pochmann, a renovação no auge

Márcio Pochmann, a renovação no auge

Por Jhonatan Almada, historiador e primeiro secretário do Instituto Jackson Lago


A renovação geracional da política é curiosa no Brasil. A depender de onde se olha, terá ares de verdadeira renovação ou de renovação às avessas. Penso na nova geração de políticos que se apresentam pela primeira vez nas eleições de 2012. Se atentarmos para o quadro de São Paulo, de fato, aparentemente percebemos uma renovação. Por outro lado, no Maranhão, nem isso, percebemos uma renovação às avessas ou tradicional, ligada ao parentesco social ampliado. Para os mais críticos, como o blogueiro César Bello, trata-se da chegada da “geração cruz-credo” ao poder, entre seus representantes temos Paulo Marinho Junior, Renato Archer Junior, Edinho Lobão, Alberto Filho, Adriano Sarney, Roberto Costa, Priscylla Sá, dentre outros. Todos vinculados a famílias políticas tradicionais, pretéritas nas ideias e nas práticas, novos apenas no que se refere à faixa etária.

Em São Paulo temos duas iniciativas de Lula: Fernando Haddad, candidato a Prefeito de São Paulo, que ganhou notoriedade mais pela aliança com Maluf do que pelo seu potencial renovador e Márcio Pochmann, candidato a Prefeito de Campinas. A segunda candidatura nos interessa mais de perto e a nosso ver, expressa uma renovação concretamente inovadora.

Márcio Pochmann é economista formado pela UFRGS e desenvolveu toda sua carreira acadêmica na Unicamp, onde cursou seu Doutorado e se tornou professor. Milita no PT desde jovem. Projetou-se como um dos principais pesquisadores do campo do trabalho no Brasil, com mais de 20 projetos de pesquisa, 100 artigos e 40 livros publicados. Sua atuação enquanto pesquisador, juntamente com a militância partidária, o alçam ao posto de Secretário Municipal de Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade da Prefeitura de São Paulo na gestão de Marta Suplicy de 2001 a 2004. Três anos depois é nomeado Presidente do Ipea no Governo Lula da Silva, permanecendo até 2012, quando se desincompatibiliza da função e vence as prévias do PT de Campinas com folgada maioria.

Sem dúvida, o trabalho de Pochmann no Ipea recolocou a importância da pesquisa aplicada ao planejamento do desenvolvimento do Brasil. Esses dois temas, planejamento e desenvolvimento receberam verdadeira injeção de ânimo, foram revivificados após a hegemonia neoliberal que grassou no mundo de meados dos anos 1980 até praticamente a metade da primeira década dos anos 2000. O Ipea renovou seus quadros, ampliou a quantidade e a qualidade dos seus estudos, pesquisas e publicações, fomentou a criação de redes de pesquisa, a integração com a Universidade e ampliou a acessibilidade e utilização dos indicadores produzidos. Em aproximadamente 5 anos, o Ipea consolidou-se como referência na produção de conhecimento no Brasil e uma das mais importantes instituições de pesquisa da América Latina, um think tank governamental do mais alto nível.

Uma das principais características do trabalho desenvolvido por Pochmann no Ipea foi a utilização da metodologia do planejamento estratégico, parcialmente inspirada no chileno Carlos Matus (1931-1998). O Ipea pautou sua atuação a partir de três ciclos de planejamento que se desdobraram na formulação da visão, missão, desafios, estratégias e metas, para os períodos 2008-2009, 2009-2010 e 2010-2011. Esse planejamento convergiu nos resultados elencados no parágrafo anterior.

Matus imaginava um novo tipo de político, um tecnopolítico, capaz de conciliar em si, a racionalidade técnica e a racionalidade política, um líder político inteligente que utilizasse sua metodologia não como método de planejamento, mas como método de governo.  

Não é possível fazer uma inferência tão peremptória, mas creio que Márcio Pochmann bem poderia vestir tal traje. Ao justificar sua indicação por Lula e aprovação nas prévias do PT, em entrevista a Folha de São Paulo, analisa sua ascensão com a emergência de novos setores sociais, as grandes mudanças econômicas e sociais que o Brasil vivenciou nas últimas décadas e a necessidade de novos quadros políticos para liderança nessa nova conjuntura. Segundo ele, o PT busca a renovação quando se encontra no auge do exercício do poder político no Brasil. De fato, o partido governa o país há 8 anos, com perspectivas para outro octênio, sob a liderança de Dilma ou Lula.

É importante observar os principais elementos de seu futuro programa de governo até agora verbalizados. A mim me parece que três linhas são elencadas como fundamentais para a construção do que chama de “nova administração planejada”. Primeiro, a descentralização da Prefeitura de Campinas, substituindo as administrações regionais ultrapassadas por subprefeituras, cujo lastro estará no orçamento participativo territorializado. Segundo, reconhecer o elevado custo de vida da cidade, especialmente em serviços privados de educação e saúde, buscando reduzi-los a partir da oferta de serviços públicos de maior qualidade. Terceiro, implementar uma administração intersetorial, articulada, matricial e integrada. Em linhas gerais, entendo que isso significa superar a atuação setorial que caracteriza a implementação de políticas públicas no Brasil e buscar uma convergência virtuosa dessas políticas, focada na resolução de problemas transversais a várias.

É necessário aguardar o lançamento oficial do seu programa de governo, aí poderemos fazer uma apreciação mais dedicada. No entanto, podemos fazer alguns comentários aproximativos. Descentralização e orçamento participativo não são ideias necessariamente novas, o caráter inovador ou não só será identificado na sua explicitação programática. Quanto ao foco na redução do custo de vida, me parece uma forma de apresentar o problema sob outro ângulo, contudo, flerta-se com a substituição do cidadão de direitos pelo cliente consumidor. Algo que não se coaduna com suas reflexões acadêmicas e posicionamentos políticos. Temos na administração matricial o elemento mais inovador, cujo caráter e operacionalidade ainda estão por ser detalhados. Certamente, trata-se de ideia mais fecunda que o pleonasmo da administração gerencial a la Bresser-Pereira.

Os próximos meses serão decisivos para confirmar ou infirmar a probabilidade aqui apresentada. Se Márcio Pochmann for bem sucedido no pleito eleitoral de 2012 em Campinas e conquistar a Prefeitura, poderá abrir caminho para uma verdadeira renovação dos quadros políticos no Brasil, não mais exclusiva ou fortemente vinculada ao parentesco, mas baseada em trajetórias pessoais meritórias, alicerçadas em compromisso político, competência técnica, conhecimento e experiência.

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