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A EDUCAÇÃO VACILANTE DO MARANHÃO: REFINANDO O BALANÇO DOS DOIS ANOS DE MANDATO


Jhonatan Almada, historiador, primeiro secretário do Instituto Jackson Lago e secretário executivo da Associação Nacional de Política e Administração da Educação (Anpae) no Maranhão.

As mensagens governamentais encaminhadas obrigatoriamente pelos chefes do Poder Executivo nas três esferas federativas (União, Estados e Municípios) são um material valioso para os intelectuais, pesquisadores e cidadãos interessados em acompanhar e fiscalizar as ações resultantes da aplicação dos recursos públicos.

As duas mensagens encaminhadas pelo Governo Roseana Sarney nos anos de 2012 e 2013 são exemplares disso. Ambas fazem um balanço das chamadas “realizações e resultados estratégicos” do ano imediatamente anterior. A mensagem de 2012 se refere às ações realizadas em 2011 e a mensagem de 2013 às ações realizadas em 2012. Interessa-nos as ações inscritas como “política educacional”, complementando o balanço dos dois anos de mandato produzido em artigo de opinião anterior.

Em relação ao ano de 2011, as principais realizações listadas foram: suporte técnico e financeiro às 746 escolas; posse de 1.197 professores aprovados em concurso; contratação de 10.000 professores; capacitação de 16.548 servidores; apoio a ações de transporte escolar que beneficiaram 38.229 alunos; fornecimento de alimentação escolar a 480.401 alunos; construção de 30 novas escolas; reforma de 42 unidades escolares e 4 bibliotecas “Farol da Educação”; aquisição de equipamentos e material permanente para 1.265 ambientes.

Analisando rigorosamente as ações listadas acima, observamos que das 1.390 escolas estaduais existentes em 2011, aproximadamente 53% receberam tal suporte. É bom lembrar que não se sabe que suporte é esse, pode ser uma simples visita de alguém da Secretaria, a chegada de R$ 1,00 na conta da escola ou o envio de uma carta com sugestões de melhoria.

Dois números também chamam a nossa atenção, os de transporte e alimentação escolar. Quanto ao transporte fica claro que o Estado anda longe da necessidade dos 491.180 estudantes de sua rede (2011), só consegue atender 7% do total. Quanto à alimentação escolar mais de 11 mil estudantes estão sem ela.

Além disso, temos o número irrisório de reformas e escolas novas frente ao tamanho da rede e a demanda reprimida por ensino médio. Sabe-se que 24% dos jovens entre 15 e 17 anos estão fora do ensino médio no Maranhão. São 99 mil jovens fora da escola e há que se duvidar se as 30 escolas construídas resolvem essa situação. Não devemos nos iludir quanto às reformas, que podem ser desde a simples pintura da fachada da escola à troca de uma torneira do banheiro. O mesmo quanto à aquisição de equipamentos e material permanente, pois tanto podem ser computadores quanto panelas.

O dado mais chocante se refere aos professores. Quando se compara o número total de ativos (mais de 29.000) e o número de chamados por concursos (1.197) e contratados (10.000), encontramos uma diferença de mais de 119%. A política de pessoal na área de educação privilegia os vínculos precários e temporários dos contratos, apesar das ações do Ministério Público Estadual, ações ainda muito acanhadas e modestas quando se referem ao Governo do Estado. O concurso público sempre é realizado com uma quantidade de vagas inferior a demanda da rede e incapaz de repor o quantitativo que se aposenta.

Em relação ao ano de 2012, as ações listadas foram: alfabetização de 40.270 crianças das séries iniciais do ensino fundamental e 47.431 pessoas de 15 anos ou mais por intermédio do Programa Brasil Alfabetizado; 35 salas construídas e/ou reformadas, sendo que, 190 salas construídas e 45 reformadas; distribuição de alimentação escolar a 420.000 estudantes e assistência a 350 escolas para correção do fluxo escolar.

No que se refere à alfabetização de modo geral a ação do Estado é extremamente limitada e irrelevante frente aos milhões de maranhenses analfabetos e a baixíssima qualidade do ensino fundamental, tão falido que é necessário aderir a um programa federal para cumprir com um dos objetivos básicos desse nível de ensino. Nesse ritmo (47 mil por ano), daqui a 70 anos não teremos mais analfabetos, provavelmente por que a maioria terá morrido.

O dado de construção/reforma é o mais estranho que já vi em uma mensagem governamental. Não se fala mais em escolas, apenas em salas. O total de salas é 35, mas no detalhamento elas aumentam para 190 construídas e 45 reformadas. Se no ano anterior ainda se construíam escolas, a política do ano seguinte voltou-se para a prática dos puxadinhos.

Além de não atender a demanda da rede, dessa vez não se fez mais nada quanto ao transporte escolar e menos ainda quanto à alimentação escolar, deixando 70 mil estudantes sem ela. Tampouco é relevante a ação de correção do fluxo escolar. Enfrentar a problemática distorção idade-série em apenas 25% das escolas da rede estadual é insignificante. As taxas de distorção idade-série são de 28,1 no ensino fundamental e 50,3 no ensino médio na rede como um todo.

Fica evidenciado que as ações desenvolvidas pelo Governo do Estado nos dois anos do atual mandato de Roseana Sarney (2011-2012) estão aquém das demandas elementares da rede de escolas estaduais. Mais evidente ainda é a ausência de resultados mais robustos quanto ao enfrentamento de problemas educacionais históricos como o analfabetismo. Isso tudo configura uma educação sem planejamento e nada estratégica. Na falta de um Plano Estadual de Educação, o Estado faz muito mal o básico do básico e sempre atua de forma vacilante ou imediatista, tomando carona nas iniciativas do governo federal.

Semana passada, novamente se falou de uma Conferência Maranhense de Educação, organizada pela Secretaria de Educação do Estado e pelo Fórum Estadual de Educação, o qual até o presente momento não disse a que veio. Será a terceira conferência sobre educação organizada no Maranhão desde 2007. Até agora, nenhuma delas resultou em um Plano Estadual de Educação. Estamos acompanhando e continuaremos atentos aos seus desdobramentos.

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