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O Delírio do Secretário

O DELÍRIO DO SECRETÁRIO

Jhonatan Almada, historiador e primeiro-secretário do Instituto Jackson Lago


Neil Gaiman, escritor e autor estadunidense de histórias em quadrinhos, nascido em 1960, compôs uma das mais reconhecidas e premiadas Graphics Novel dos últimos tempos, chama-se Sandman. A história gira em torno do personagem Sonho (Dream), principal irmão dos sete “perpétuos”, formados por Destino (Destiny), Morte (Death), Destruição (Destruction), Desejo (Desire), Desespero (Despair) e Delírio (Delirium).

Delírio é representado por uma jovem mulher que ostenta vários títulos, entre eles, o de Rainha dos Loucos e Rainha dos Bêbados. Ela enxerga o mundo de um jeito único, devido aos seus olhos, um azul e outro verde. É um amontoado de fragmentos, ideias e sua sombra nunca tem qualquer relação com a forma do corpo. De todos os perpétuos é a mais mutável, instável e inconstante.

Delírio visita regularmente o Maranhão e fez morada no principal grupo político local, liderado pelo senador José Sarney. Parece-nos que todos os integrantes desse grupo, regularmente, em suas manifestações públicas, aparecem acompanhados de Delírio. O senador José Sarney, como já afirmado em outros escritos, é um dos seus mais fiéis devotos.

Nas suas mais recentes visitas, esteve com a governadora Roseana Sarney, filha de José Sarney. Delírio manteve também longas conversas com o secretário de saúde do Estado do Maranhão, Ricardo Murad, cunhado da governadora. Os frutos dessas visitas e conversas podem ser acompanhados em dois fatos recentemente ocorridos, a postagem no Facebook, feita por Ricardo Murad contra Flávio Dino, um dos líderes da oposição ao aludido grupo político; e o lançamento de mais um famigerado programa de saneamento público às vésperas das eleições municipais de 2012.

O secretário Ricardo Murad em uma ação desrespeitosa postou foto de Flávio Dino, chorando pelo falecimento de seu filho. Logo abaixo da foto, Murad o acusa de utilizar dinheiro da agiotagem para financiar sua campanha nas eleições de 2010.

O secretário se apresenta como a nova vestal da moralidade pública, depois de inúmeras reportagens e denúncia pelo Ministério Público do Estado do Maranhão, contra os superfaturamentos, as licitações irregulares e a ausência de qualquer critério técnico na construção dos “hospitais” do propalado Programa Saúde é Vida. Para termos uma ideia da força de Delírio, até o Ministro da Saúde, em declaração atribuída pelo jornal de propriedade do grupo, afirmou que esse Programa não tem paralelo no mundo.

Concordo plenamente, qualquer estudioso das políticas públicas de saúde, tem conhecimento que o caminho mais exitoso na maior parte dos países e recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é o da “regionalização da saúde”. Para efetivá-la é fundamental, entre outras coisas, possuir informações demográficas e epidemiológicas da população; realizar inventário dos serviços existentes e dos recursos utilizados; consultar a comunidade onde será instalado o serviço; conhecer todos os aspectos ligados à acessibilidade dos serviços; ter um diagnóstico da capacidade das instituições de ensino em formar profissionais de saúde em face das oportunidades de emprego; e por último, implementar planejamento conjunto, controle de qualidade e avaliação permanente dos serviços.

Nada do acima mencionado embasa o Programa Saúde é Vida. Por isso esse programa realmente não deve ter paralelo no mundo. Apenas o Delírio que acomete o grupo político do senador José Sarney, da governadora Roseana Sarney e do secretário Ricardo Murad, o mais afetado de todos, justifica tal Programa.

Todas as praias de São Luís estão impróprias para banho, até o reino mineral sabe que essa poluição vem dos bares, mansões, apartamentos e condomínios de propriedade da elite política e empresários. São Luís possui duas Estações de Esgoto, Jaracaty e Bacanga. Nenhuma funciona efetivamente. Andem de ônibus até o campus da UFMA e olhem pelas janelas quantas árvores já cresceram no que deveriam ser tanques para tratamento do esgoto.

Sem ter resolvido o não funcionamento das estações existentes, eis que o Secretário Ricardo Murad e a governadora Roseana Sarney anunciam a construção de duas novas estações. Quando todas as obras anunciadas forem concluídas estima-se que sairemos do patamar dos 15% atuais, para 60% de esgoto tratado. O que não ocorrerá em menos de 5 anos, contando prazos licitatórios, início das obras, licenças ambientais, atrasos e operação. E claro, se a produção atual de esgotos não aumentar até lá. Nem preciso comentar o abastecimento de água, precaríssimo e feito a base de carros-pipas, versão moderna dos “agudeiros” do século XIX, escravos que carregavam água nas costas.

O símbolo de Delírio é uma bolha colorida, um tanto abstrata e sem forma. A julgar pelo observado no Maranhão, não falta muito para que essa bolha seja estourada. O fundamental é agir com uma inteligência determinada para fazê-lo.

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